quarta-feira, 21 de outubro de 2009

PRIVILÉGIO

Como se eu fosse um privilegiado Deus mostrou-se a mim

dizendo-me que teria um tempo a mais de vida.

Passada a surpresa sentei no banco junto à lagoa

e vejo como tudo tinha que ter sido diferente.

Deixei de dizer tantas coisas que, se tivesse dito,

te faria feliz - mas as palavras que querias escutar

(um simples "eu te amo"), permaneceram caladas em mim.


E agora, que precisava dizê-las, onde estás?...


Nesta sobrevida que começou agora

penso nos amigos que nunca mais procurei,

e, se o tivesse feito, teria sentido

o surpreso e apertado abraço de cada um.

Permiti que o tempo se fosse e perdi-os,

como perdi manhãs de sol, noites grávidas de estrelas,

o vôo sem igual dos beija-flores, o vento ventando

e trazendo recados que não tive paciência de procurar entender.


Na vida a mais que Deus me concedeu

devo aprender a ouvir, e a dizer a tantos outros

o que esperaram ouvir de mim - e que não disse;

a não dar importância às coisas mínimas que podem

valer nada, mas escondem tantas verdades...


Preciso ser eu mesmo e o serei, neste tempo maior de vida

que nem sei o quanto vai durar.

Penso, enquanto caminho pela areia,

que Deus, ao me prometer novos amanhãs,

estava me concedendo algo que sabia que necessito:

o dia que vai nascer poderá ser o último amanhã que me reste

e eu preciso livrar-me de todos os meus remorsos.


Théo Drummond



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