segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

SAUDADES DO MEU PAI

Sinto falta de ti e um grande remorso

por não te ter ouvido o quanto deveria.

Eras o espelho no qual poderia ter me olhado

e transformado minha estúpida inexperiência

em algo que valesse a pena.

Eras a mão que pressionando levemente meu ombro

tentava me apontar um rumo sem exigir que o seguisse.

Eras o olhar que olhava longe

para me mostrar ser possível ir até lá.

Eras a voz calma que conseguia abafar a estridência

dos meus gritos quando eu sentia a raiva dos que não sabem entender.

Eras o espantalho dos meus medos.

Eras o silêncio que tranqüiliza, afaga e relaxa.

Eras a luz na escuridão a afugentar meus fantasmas.

Eras o calor da presença, o muro onde podia me apoiar.

Eras a água que me regava, a árvore que me dava sombra,

a casa que me protegia dos ventos e da chuva.

Eras a disfarçada fortaleza onde encontrava sempre

os portões abertos para me receber e proteger.

Eras “o que estava por perto”, como que por mera

casualidade, em todos os meus instantes de fraqueza.

Eras o companheiro perfeito que no pequeno barco

me ensinava o que era o mar.

Eras, na verdade, meu único amigo...


Hoje vejo que te perdi porque não quis te ter

na plenitude do que me oferecias.

Hoje sinto quanto a mais poderia ter aprendido contigo

e quanto a menos com isso teria sofrido.


Pequeno e inútil príncipe que julguei ser, hoje choro

ao perceber que não te aproveitei, que não te usufruí

pela tola razão de imaginar-te eterno.


Théo Drummond

(Do livro Vôo de Nuvem/1993)



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